terça-feira, 11 de junho de 2013

Tarot - Episódio: Vânia

       Seguindo os contos da série Tarot - Em busca do amor incerto. Seguindo agora, os episódios tem o nome das  mulheres que Pablo tenta se apaixonar para provar que a previsão de madame Emengarda está errada. Primeiro episódio aqui.

Vânia


       Depois do encontro desastroso que tivera com madame Emengarda, Pablo estava decidido a não fazer mais nada pelo resto do dia, pelo menos nada que o deixa-se com mais raiva. Então, voltara a fazer o que tinha começado a fazer naquele dia: ir para o trabalho.
       Pablo era programador de uma empresa de médio porte em New Castle, uma cidade inglesa. Não era lá grandes coisas, passava o dia inteiro sentado. Levantava-se apenas para tomar um café e para ir pra casa. Conhecia praticamente todo mundo do edifício, mas ser amigo deles era algo totalmente diferente. 
       Chegara, batera seu ponto e foi direto a sua mesa e ao bom e velho computador. O chamava de "bom" apenas para esquecer que o computador era mais lerdo do que um golfista na prancha de surf. Já cansara de fazer pedidos para que o trocassem, mas teria de ser o dele e mais duzentos computadores, então preferiam deixar como estava até estragar de vez. Enquanto isso, Pablo não tinha o que fazer, a não ser esperar.
       As palavras da cartomante enevoavam seus pensamentos. Ele tentava se distrair com outras coisas. Ouvia um pouco de música, tentava ler algum jornal ou revista velha. Até tentava conversar com alguém ao seu lado. Mas o único alguém era Vânia, que estava extremamente ocupada com seus programas e códigos.
       "Por três longos anos irá pelejar a procura do amor!". Essas palavras iam e voltavam em sua cabeça. "E só ira encontrá-lo no aniversário de três anos da tarologia em sua vida!". Estava tão distante, tentando esquecer essas palavras, que não notara que a tela de seu computador já pedia-lhe a senha para que pudesse acessá-lo. E por duas horas se esqueceu de seu dia incomum.
       As três da tarde, ele se levantara para esticar as pernas, comer alguma coisa e depois voltar ao trabalho. Desligando-se de suas tarefas por poucos segundos, começou a pensar novamente na tarôloga. "Para o inferno ela! Ela, o Lou e a vaca da Shirley!" Estava começando a se estressar com isso.
       Ao final do trabalho, ele apenas desligara seu equipamento e resolvera pegar o metrô para casa. Apesar de ser perto, e ter que andar mais para pegar o trem, não queria passar nem perto da casa da madame Emengarda. Pelo menos não por enquanto. 
       Saia do prédio, descia as escadas da estação e se sentava, esperando seu transporte chegar com uma multidão de pessoas. Era o final do expediente e todos aguardavam ansiosamente para chegar em casa. Até mesmo Pablo, que queria esquecer de vez este dia. Então o trem chegara e ele entrava. Mas era um dos último, tendo de ficar próximo a porta para que pudesse permanecer no metrô. Azar ou não, quando as portas se fechavam a frente dele, ele vira, sorrindo, madame Emengarda, em mais um de seus vários anúncios.
       Em um excesso de raiva, ele esmurrava a porta e chamava a atenção de todos. Não por ter danificado a porta, ou pelo barulho que ela fazia. Mas sim porque logo envolvia a mão a outra, choramingando pela dor que sentia. Parecia que tinha quebrado todos e mais alguns ossos da mão e do punho. Então encenava que tinha sido um acidente, deixando a todos risonhos ou até mesmo preocupados. 
       Já em casa, com a mão envolta a um saco de gelo, resolverá se sentar ao sofá e ligar a televisão. A sala de Pablo era um tanto modesta. Tinha 3 x 4 metros, com uma televisão em uma das paredes e o sofá encostado na parede oposta. Ainda havia um tapete, presente da mãe. Mais azar ainda, o dia seguinte seria o dia dos namorados. E, de cada 10 anúncios da TV, 11 eram sobre isso. Mais dor de cabeça.

- X -

      Dia seguinte tentava começar com o pé direito. Não dormira a noite pensando nas palavras da cartomante e em Shirley, dessa vez se lembrando do tempo em que demorara no banheiro do restaurante nos dia dos namorados do ano anterior. Se lembrara de um dos clientes entrar um pouco antes dela e sair um pouco depois. Estava com o humor azedo naquele dia.
        Já no trabalho, depois de contornar o quarteirão da casa da tarôloga para não correr o risco de ver ninguém de lá, estava decidido a tomar uma providência a respeito de sua situação. Batera o ponto, cumprimentava Vânia e se sentava, ligando seu computador-carroça novamente. Pensava então em uma solução.
       Beber até cair? Não... Ele não era de beber, muito menos até cair. Arrumar alguma prostituta por aí? Definitivamente não estava tão desesperado assim. Ir a uma festa? Ele estava tão animado que transformaria a balada em um triste velório. Quem sabe ajeitar aquele copo de café que estava na beirada da mesa?
       Café? Mesa? Ãh? No meio de seus pensamentos, devia ter colocado o café na beirada, mas já era tarde. Quando pensara em agir, metade do café estava no chão e a outra metade no vestido de sua companheira de trabalho. A sorte que o café não estava quente, mas mesmo assim teria de se ver com Vânia. E fora neste momento que reparara melhor na moça.
       Vânia devia ter aparentemente 22 anos. Tinha mais ou menos 1,70 de altura. Não era uma formosura, mas tinha sua beleza. Seus cabelos castanhos estavam divididos em duas tranças, e seus óculos de armação vermelho vinho deviam ter lentes de farois, pois nunca vira lentes tão grandes. Mas o que chamava a atenção dele era o sorriso dela. Apesar de estar nervosa pelo café derramado, era apenas por susto, pois entendia que tinha sido um acidente. Ela então se levantava e ia se limpar, enquanto Pablo rapidamente se levantava para chamar alguém para ajudar a limpar o chão.
       Enquanto limpava, e ao ver Vânia voltar, Pablo pensara que ela não era feia. O que será que ela fazia longe do trabalho? Onde morava? Será que tinha família? De repente, impulsionado pela praga da cartomante, Pablo estava decidido a convidá-la pra sair, ou outra coisa do gênero. Depois de terminar a limpeza, ele se sentava e estudava a melhor forma de fazer isso. O pior é que o pobre coitado não tinha nenhum jeito com as mulheres. Então, fazia o que tinha pensado em fazer de uma forma incomum.
       - É... Me desculpe de novo Vânia, não queria derramar café em você.
       - Não tem problema Pablo, essas coisas acontecem. - Ela dizia aquilo sem nem mesmo olhar para ele. Estava tão focada no trabalho que já tinha se esquecido do acidente.
       - Eu...eu estava pensando... poderia me desculpar com você lhe pagando uma cerveja, ou outra cosia se quiser. Não precisa ser hoje, pode ser depois, sei lá... quando tiver tem...
       - Legal, quando saímos vamos a um bar aqui perto. - Ela o atropelava e já aceitava sair com ele, apesar de Pablo não saber bem se ela tinha entendido o que ele tinha dito ou se ele mesmo tinha a entendido. Mas resolvera não fazer mais perguntas.
       No final do expediente, lá estavam os dois. Vânia guardava os grandes óculos e estavam os dois a caminho do bar. Ele percebia como os olhos dela eram lindos. Castanhos escuros, parecendo gotas de chocolate. Distraindo-se neles, acabara sendo pego quando ela olhou pra ele. Ambos ficaram envergonhados e não falaram nada pelo resto do caminho.
       Durante todo o "encontro", foram pouquíssimas palavras. Falaram um pouco de programação, beberam um pouco e depois apenas olhavam para os lados. Então, quando Pablo estava decidido a falar sobre algo mais intimo, uma sombra surgira as suas costas que tinha, pelo menos, metade do tamanho dele.
       Olhava pra trás e via um gigante de aproximadamente dois metros, sorrindo para ele. Não sabia o que tinha feito de errado agora, até Vânia levantar-se e abraçar aquele homem.
       - Pablo, este é Hans, meu noivo! Vamos nos casar daqui a quatro semanas!
       - Vou desencalhar meu amigo. Prazer, Hans!
      Neste momento, o brutamontes estendeu sua mão a Pablo. Ele só podia fazer o mesmo. E justamente a mão cujo esmurrara a porta do metrô foi a que ofereceu. Toda a dor que tinha sentido voltava novamente ao forte aperto de mão de Hans. Não teve como disfarçar, causando uma boa risada em Vânia e seu noivo.
       - Desculpe rapaz, parece que a Vânia vai se casar com um homem grosso. - Em seguida lhe dava um beijo.
       - Hum, seu besta. Sente-se conosco.
       Depois de cinco minutos de conversa, Pablo estava lá apenas segurando vela para os pombinhos. Tanto que nem percebera que ele se levantava e ia embora, deixando apenas algum dinheiro para pagar o dele e o de Vânia, como tinha prometido.
       Voltava pra casa e se sentava no sofá novamente. Assistia um pouco de TV e dava graças por ter menos anúncios do dia dos namorados naquele dia dos namorados. Então, levantava o saco de gelo que estava na mão duplamente machucada e o encarava.
       - Feliz dia dos namorados, saco de gelo idiota! - E esse fora um fracassado dia dos namorados para o pobre programador.

- FIM -

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